Se não se lembram de ter ouvido falar do nome de Portugal numa edição qualquer dos Óscares, não é porque estavam distraídos. É simplesmente porque tal nunca aconteceu. Portugal detém o recorde (empatado com o Egipto) do maior número de submissões de filmes à categoria de Melhor Filme Estrangeiro sem qualquer nomeação e provavelmente sem sequer constar nas short lists anteriores à divulgação dos cinco nomeados.
Ora este é um feito raríssimo na Europa, com poucos os países a nunca terem sido nomeados na categoria, conforme a imagem abaixo indica. (A verde escuro constam os países que já venceram pelo menos uma vez na categoria e a verde claro, os países que pelo menos obtiveram uma nomeação).
Portugal submete filmes desde 1980 e as suas 27 submissões nunca foram nomeadas. Dessas, nove filmes eram realizados por
Manoel de Oliveira, provavelmente o cineasta português mais conhecido em todo o mundo. Contudo, mesmo assim os filmes submetidos nunca surtiram grande efeito junto dos membros da Academia. Qual será a razão? O gosto da Academia norte-americana é particularmente conservador, mais assente em dramas com histórias motivadoras, histórias de esperança ou chamadas de atenção com temáticas como do Holocausto. Basta olharmos por exemplo para as cinco últimas cerimónias onde os vencedores foram o dinamarquês
In a Better World (um drama em mosaico, com tendência moralista e lições geopolíticas e conclusões sobre a amizade, família e tolerância), o argentino
El Secreto de sus Ojos (uma história extremamente bem contada, uma espécie de regresso ao cinema clássico norte-americano com uma temática forte, mas que fala sobretudo do poder do amor), o japonês
Departures (um filme inspirador, poético e delicado sobre a família, vida e morte, sucesso e comunidade), o austríaco
The Counterfeiters (ambientado na II Guerra Mundial, sobre um falsificador de dinheiro condenado aos campos de concentração de Auschwitz) e o alemão
The Lives of the Others (uma reflexão sobre a condição humana numa Alemanha fascista pós-queda do Muro de Berlim). Todas os pressupostos habituais estiveram envolvidos na produção destes filmes, daí que - gostos e qualidade à parte - é perfeitamente natural dentro dos parâmetros habituais da Academia, que estes tenham sido os vencedores.
Como funciona esta categoria? Uma cópia com legendas em inglês enviada por cada país para a Academia. Todos eles são mostrados a um comité especializado, constituído por trinta membros, incluindo dez membros nova-iorquinos, que em meados de Janeiro submete uma short list de nove filmes, que depois é reduzida a cinco nomeados. Apenas, esses cinco nomeados são mostrados a todos os membros da Academia norte-americana.
E Portugal? O que tem apresentado? Não discutimos a qualidade dos filme submetidos, mas sim o género. Habitualmente o ICA submete filmes de autor, com temáticas abstractas ou fortes, que não fazem o género da Academia (nem do público português), mesmo que tenham tido boa recepção na crítica especializada. Crítica essa que habitualmente não corresponde ao perfil da Academia. Então o que precisamos? Provavelmente de filmes portugueses que façam carreira comercial (e não apenas a nível de critica) nos Estados Unidos e que chamem a atenção da Academia a cada ano que passa. Precisamos de ganhar renome lá fora, como o caso de festivais internacionais - já tivemos recentemente uma Palma de Ouro para Melhor Curta-Metragem, um Leopardo d'Ouro no Festival de Locarno, o ano passado mais que um título português figurou em listas internacionais de melhores filmes do ano, entre outros.
Abrimos aqui o debate, o que é necessário para um filme português ser nomeado ao Óscar de Melhor Filme Estrangeiro?